quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Cabeça, olho e coração numa mesma linha de mira

Estou gostando dessa coisa de vagabundear a pé pela cidade. Dias atrás me peguei filosofando sobre o momento da espera de um ônibus. Existe tempo mais improdutivo ? Por outro lado, existirá melhor ocasião urbana para se esvaziar a mente que os minutos de espera de um ônibus? Nada acontece. Passam vários ônibus que não servem e continuamos lá. Não existe a menor possibilidade de se acelerar a chegada do ônibus esperado. Resta apenas ficar e esperar. Esperar um ônibus e não fazer nada além de espera-lo é uma qualidade de ação que esta sendo atropelada por uma necessidade de se aproveitar o tempo fazendo algo, obedecer a um impulso de ter que aproveitar o tempo com alguma coisa produtiva. Esperar um ônibus é minha mais recente meditação. Gosto de ler, gosto de escrever, gosto de conversar e estou gostando de dedicar parte do meu dia a não fazer nada, apenas observar a paisagem sem nenhum desejo de preencher estes momentos com alguma coisa.

Ontem, fui vagabundear depois do almoço pela exposição de fotos de Henry Cartier-Bresson no SESC Pinheiros. Comecei pelo 3º andar onde estão expostas imagens de fotógrafos influenciados pelo olhar bressoniano como Cristiano Mascaro. No térreo, assisti a um breve documentário recheado de fragmentos de conversas com Henry Bresson que entre outras coisas tocantes diz que teme a dor, mas não teme a morte. No últimos anos de vida ele deixou de fotografar e passou a desenhar. Dizia que fotografar é ação e desenhar é meditação. Fiquei encantado com seus rabiscos e com a vitalidade com que viveu sua vida. Quero voltar em breve para parar em frente de suas fotografias e desenha-las. Como exercício de gratidão ao poeta do olhar.

Cherrybone
Simiane-la-Rotonde (France, 1969)


O IMAGINÁRIO A PARTIR DA NATUREZA
[Texto de Cartier-Bresson]

A câmera fotográfica é para mim um caderno de esboços, o instrumento da intuição e da espontaneidade, o mestre do instante que, em termos visuais, ao mesmo tempo questiona e decide. Para “significar” o mundo é preciso sentir-se implicado naquilo que se recorta através do visor. Essa atitude exige concentração, sensibilidade, um senso de geometria. É por uma economia de meios e, principalmente, um esquecimento de si que se chega à simplicidade de expressão. Fotografar: é prender o fôlego quando todas as nossas faculdades convergem para captar a realidade fugidia; é aí então que a apreensão de uma imagem é uma grande alegria física e intelectual. Fotografar: é num mesmo instante e numa fração de segundo reconhecer um fato e a organização rigorosa das formas percebidas visualmente que exprimem e significam esse fato. É pôr na mesma linha de mira a cabeça, o olho e o coração. É um modo de viver.

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